Como é que perguntava Musset? Era qualquer coisa neste sentido: ‘Porque é que escrevemos sobre as pesssoas que amámos? Para as imortalizar ou para acabar de as matar dentro do nosso coração?’ Interrogação sem resposta possível para mim, mesmo que estivesse ao meu alcance ‘imortalizar’ alguém. Agora, aqui, em Madrid, nesta cama de hotel, passado o meio-dia e depois de uma sórdida noite alcoólica, como é que vou responder à questão que Musset terá colocado a Sainte-Beuve, quase sem fôlego, depois de abortada a relação com George Sand? Quem imortaliza quem, que importa tal bizantinismo? Importa, sim, se de facto conseguimos libertar-nos de uma pessoa escrevendo sobre essa pessoa. É isso que importa. O resto é literatice, estafada literatice, jogo de salão, grotesca renda de bilros, nada tem a ver com a existência profunda dos lastimáveis seres humanos que todos somos.