Domingo sem festa
Domingo sem festa
de Victor Lampert e Lúcio Martínez
96 pp.
Urutau, 2021
9786559000418
Cinco pessoas confinadas em um apartamento se esparramam no sofá, cutucam o umbigo e são sugadas para dentro. Lá fora, algo acontece.
Como foi que a gente chegou nesse bunker? Agora o som de dentro se amplifica o suficiente para abafar outros sons e podemos ouvir – se prestarmos muita atenção – o nosso suco gástrico digerindo os alimentos, uma música da Xuxa dos anos 2000, a água passando pela tubulação do prédio, a couve lentamente apodrecendo fora da geladeira. Enquanto acumulamos poeira em nossos braços e arqueamos a coluna ainda mais, começamos a ficar mais íntimos da mobília e arrumamos coragem para puxar assunto com as paredes. Não há problema em falar com elas, o problema é se elas responderem: aqui nesta cidade elas não são confiáveis, estruturas antigas, fiações de pano, gesso caído enfeitando os rodapés.
Domingo Sem Festa se isola, sem nunca se excluir do mundo. Os fragmentos da cidade começam a andar pelo texto como pequenas baratas, compondo e se relacionando com o insalubre metro quadrado. A esses corpos confinados é realizado um convite à fabulação. Melissa fura jornais para produzir confetes. Gustavo trava diálogos com a privada. Villa apenas fecha os olhos. Na escassez de material, cabe-nos produzir outras realidades com o que nos resta. No limite do possível, alguma coisa nos acontece.
Por acaso, Lúcio e Victor decidiram tecer esse texto e fabular encontros em plena pandemia. Inacreditável. Graças a deus. Sim, Domingo sem festa, mas e semana que vem? As palavras aqui transpiram e invocam o desejo de grupo, movimentando-se solto por todos os espaços onde o corpo ainda não pode ir. Ainda. Em breve. Enquanto isso, que bom encontrar pessoas que conversam com as paredes, que transcrevem os sonhos, que fitam o abismo. Depois de tudo que aconteceu e ainda nos acontece, leio esta dramaturgia e percebo que ainda sobraram algumas pequenas coisas por aqui: alguns palitos de dentes, a crença no absurdo, a vontade de pular. Victor Lampert e Lúcio Martínez
Lane Lopes
de Victor Lampert e Lúcio Martínez
96 pp.
Urutau, 2021
9786559000418
Cinco pessoas confinadas em um apartamento se esparramam no sofá, cutucam o umbigo e são sugadas para dentro. Lá fora, algo acontece.
Como foi que a gente chegou nesse bunker? Agora o som de dentro se amplifica o suficiente para abafar outros sons e podemos ouvir – se prestarmos muita atenção – o nosso suco gástrico digerindo os alimentos, uma música da Xuxa dos anos 2000, a água passando pela tubulação do prédio, a couve lentamente apodrecendo fora da geladeira. Enquanto acumulamos poeira em nossos braços e arqueamos a coluna ainda mais, começamos a ficar mais íntimos da mobília e arrumamos coragem para puxar assunto com as paredes. Não há problema em falar com elas, o problema é se elas responderem: aqui nesta cidade elas não são confiáveis, estruturas antigas, fiações de pano, gesso caído enfeitando os rodapés.
Domingo Sem Festa se isola, sem nunca se excluir do mundo. Os fragmentos da cidade começam a andar pelo texto como pequenas baratas, compondo e se relacionando com o insalubre metro quadrado. A esses corpos confinados é realizado um convite à fabulação. Melissa fura jornais para produzir confetes. Gustavo trava diálogos com a privada. Villa apenas fecha os olhos. Na escassez de material, cabe-nos produzir outras realidades com o que nos resta. No limite do possível, alguma coisa nos acontece.
Por acaso, Lúcio e Victor decidiram tecer esse texto e fabular encontros em plena pandemia. Inacreditável. Graças a deus. Sim, Domingo sem festa, mas e semana que vem? As palavras aqui transpiram e invocam o desejo de grupo, movimentando-se solto por todos os espaços onde o corpo ainda não pode ir. Ainda. Em breve. Enquanto isso, que bom encontrar pessoas que conversam com as paredes, que transcrevem os sonhos, que fitam o abismo. Depois de tudo que aconteceu e ainda nos acontece, leio esta dramaturgia e percebo que ainda sobraram algumas pequenas coisas por aqui: alguns palitos de dentes, a crença no absurdo, a vontade de pular. Victor Lampert e Lúcio Martínez
Lane Lopes